Page 43 - Boletim APE 253
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 PALAVRAS SOLTAS
O que eu digo
O que eu digo é este nada.
Este silêncio. Este vazio.
Este espaço desocupado
entornado numa bica, num bagaço. Este fumo que me envolve, me inebria e me arrasta o pensamento
mesmo para além daquilo
que é lícito imaginar.
Este espaço despejado dos utensílios da vida, das ferramentas do sonho.
O que eu digo,
é este limite, este infinito,
este intervalo longo e breve,
cansativo, inconsequente,
este intervalo sem tempo nem espaço.
O que eu digo,
é este enorme regaço dos dias
que acontecem por simpatia,
por acréscimo,
por sol,
por luas,
        Ernani Balsa
19600300
por marés e calendários,
estes dias
em que a música
é aquela que apenas nos vem de um rádio e não a que nos nasce no ouvido.
O que eu digo,
é este tempo despojado de palavras, este corpo pudicamente vestido
de expressões quotidianas,
de gestos
mais que cansados e nulos
que acontecem no papel-químico que todos somos.
O que eu digo,
é esta paralisia do pensamento, esta prótese do diálogo
que todos os dias arrastamos
na nossa boca,
soletramos no nosso isolamento.
          Boletim da Associação dos Pupilos do Exército • abril a junho | 41





























































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