Page 9 - Anexo do Boletim numero 254 da APE
P. 9

   A OPERAÇÃO ZAGALOTE
------------------------------- José Manuel Pedroso da Silva
19570414
Quando, nos meados de 1994, fui colocado na Direção do Serviço Histórico Militar (hoje, Direção de História e Cultura Militar), situada na rua Marquês de Ponte do Lima, comecei a almoçar nos restaurantes ali da zona da Mouraria, o que para mim foi estranho principalmente porque durante grande parte da minha vida tinha almoçado nas messes dos quartéis onde prestei serviço. Aí, o convívio em sã camaradagem era fator sempre presente. Agora, após uma manhã a tratar de assuntos ligados à Heráldica do Exército, apenas via dois ou três camaradas, embrenhados no estudo da chamada Guerra do Ultramar. Ao meio-dia interrompiam-se os trabalhos e cada um seguia o seu rumo. Eu almoçava por lá – sozinho, é claro – para prosseguir o trabalho da parte da tarde.
Nestas incursões quase diárias em terreno gastronómico, descobri uma casa início da íngreme Calçada do Monte – o Cantinho do Custódio, nome do seu proprietário, coadjuvado na cozinha pela sua mulher, a Dona Laurinda. O casal era muito simpático, os preços, interessantes e a confeção, excelente com pratos estipulados para cada dia da semana.
À segunda-feira, havia sempre uma boa posta de bacalhau cozido, acompanhado com um grão tão macio e tão bem apaladado que me fazia lembrar, pelo contraste, aquele que muitas vezes ingerira anteriormente, tão duro que merecia a alcunha de “zagalote”, o tal chumbo grosso tão bem conhecido dos amantes da atividade cinegética.
Frequentador assíduo daquele lugar, sobretudo às segundas-feiras, assisti a algumas transformações entretanto verificadas, nomeadamente remodelação do espaço interior e reforço da equipa empresarial com uma jovem dinâmica e filha dos donos, a Dona Ilda, igualmente simpática.
Em 2003 as refeições de segunda-feira passaram a ser
mais animadas. Deixei de almoçar sozinho passando a ter o privilégio da companhia sempre agradável do Zé Leandro (19510321) que, por essa altura, deixara a efetividade de serviço.
E foi assim que a partir de um embrião maioritariamente constituído por Pilões dos anos cinquenta e sessenta, com o andar dos tempos muitos se nos juntaram independentemente da sua origem ou idade. Hoje, os “operacionais”, são todos os que quiserem aparecer para, à volta de um prato de bacalhau com grão, ou de outra coisa qualquer, contarem uma boa história e darem umas boas gargalhadas. Todos são bem-vindos. O que nos interessa é manter o espírito fraterno inicial e não se pergunta a ninguém qual é a sua filiação – clubística, partidária ou outra. Não se pergunta, é certo, mas os semblantes de segunda-feira, uns mais pesados, outros mais felizes, não conseguem esconder qual o clube da paixão de cada um dos convivas e por vezes a acalorada troca de argumentos salta para cima da mesa. Nessa altura costuma ouvir-se um desabafo: – E vim eu do Montijo para ouvir discutir futebol...
Se bem que o primeiro registo fotográfico seja de novembro de 2013, a “Operação Zagalote” tem já cerca de 120 encontros documentados fotograficamente.
Em fevereiro de 2018, em pleno almoço, fomos abalados pela trágica notícia de que um dos principais entusiastas da Operação Zagalote – o Zé Leandro – deixara o seu lugar por preencher... para sempre.
O sentimento foi de profunda consternação, já se vê, mas ao mesmo tempo com a determinação de continuarmos estes convívios semanais, uma forma de homenagear este nosso camarada cuja vida se pautou por um enorme espírito de fraternidade.
 9 | Anexo Digital ao Boletim da Associação dos Pupilos do Exército • julho a setembro
20nov2017




















































































   7   8   9   10   11