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CRÓNICAS
o esTado soCIal e o NeolIberalIsMo
Manuel duran Clemente | 19530030
A. LINCOLN, presidente americano, em 1865 afirmou: «só esforços do movimento ATTAC/Taxa Tobin ao constituir proposta nesse
é possível acabar com a guerra civil se acabarmos com a sentido. Por outro lado o Trabalho é dominado pela sua não fácil
escravatura». mobilidade, pelo domínio de salários baixos e imposição de taxas.
O Capital financeiro (por vezes virtual, graças à “internet”) impôs-se ao
or analogia, podemos dizer hoje que o ataque ao estado social só Capital produtivo e tornou-se mundialmente implacável criando, na
Pacaba quando acabar o ataque à DEMOCRACIA, à LIBERDADE, às realidade, mecanismos que visam a escravização do labor.
CONQUISTAS DE ABRIL, ao esforço desenvolvido, com abnegação, Junte-se a isto, com a queda do muro de Berlim, a entrada dos seus
pelos portugueses durante estes últimos 39 anos. países num capitalismo selvagem e a “capitalização do socialismo
Só acaba quando acabar um poder com as práticas de gestão chinês” e verifica-se como o Trabalho enfrenta hoje, de novo, enormes
nacional obedecendo ao padrão duma ideologia, antissocial e insensí- barreiras na luta por uma sociedade mais justa e humana.
vel à realidade do país. A globalização do Estado Social nunca poderia ocorrer tal como a
Só acaba quando formos capazes de arredar da nossa vida o neo- do Capitalismo.
liberalismo. Neoliberalismo que teima em repor o capitalismo no pata- Não ocorrendo uma globalização da Democracia e não havendo em
mar em que ele se encontrava antes do Estado Social ser erguido e ter muitas partes do planeta necessidade do referido compromisso do
atingido maturidade. Capitalismo, pelas razões que justificaram esse compromisso no pós-
-guerra, tratou o Capitalismo de se encarregar, pela mão da sua corren-
*** te neoliberal, da missão de destruir o Estado Social onde ele tinha sido
Como sabemos este Estado Social foi conseguido após longo pe- criado e agora se manifesta como um obstáculo à sua cega expansão.
ríodo histórico de guerras destruidoras, de lutas sociais ferozes e de As justificações são forjadas e contam com a perversa auto des-
crises económicas graves. Correspondeu a um compromisso dentro do truição do próprio Estado, através dos mecanismos da corrupção e de
próprio Capitalismo, onde se digladiavam (e continuam a confrontar-se) artifícios habilidosos.
as suas duas correntes: a de John Keynes (capitalismo-Renano, ten- Tudo se faz para conduzir à ideia de que o Estado é ineficaz e que
dencialmente Social-Democrata) e a de Milton Friedman (capitalismo há que mudar para o Privado o que este sabe fazer melhor (?) e mais
Anglo-Saxónico, completamente Neoliberal). barato (?), afirmações que a prática tem negado, e retirar ao Estado e
Foi assim, face a uma necessidade do Capitalismo, com a ajuda da dar ao Mercado a regulação social.
sua corrente Keynesiana, reforçada com o imperativo de fazer frente ao Ataca-se tudo o que seja aparente bom negócio não hesitando
Socialismo e ao Comunismo, que foi erguido o compromisso do Esta- mesmo perante os resultados catastróficos para os cidadãos e que
do Social com cedências de ambos os lados: Capital e Trabalho. estes tão vivamente contestam. O sector público, com base no esvazia-
O Estado Social, através dos impostos e dos contributos dos cida- mento dos seus meios e na compra de funcionários corruptos, aposta-
dãos (de forma singular ou colectiva) veio desenvolver um conjunto de dos em afundar este sector e justificar as mudanças exigidas, é consi-
políticas públicas e sociais favoráveis aos dois interesses contraditórios derado estéril e inoperante. Acentua-se aqui o fenómeno da corrupção,
e acaba por desempenhar um papel essencial na implementação das maleita natural do capitalismo e mola real do afundamento das socie-
democracias europeias, construindo e consolidando estabilidade e paz. dades democráticas e do avanço do neoliberalismo.
Com ele atingiram-se, na realidade, níveis de desenvolvimento signifi- O que está em causa é a definição da sociedade que se quer cons-
cativos. truir: uma sociedade onde os detentores do capital explorem e dominem
Mas o capitalismo não descansou. Após atingir um grau de desen- os trabalhadores, colocando-os em situações de autêntica escravidão,
volvimento apreciável, afastados com a queda da “cortina de ferro” os, como acontecera outrora.
por si considerados, perigos do socialismo real, o Capitalismo encon- O facto é que nos últimos tempos se assiste ao maior dos retro-
tra novos apoios para alterar profundamente a sua estratégia de acção. cessos nas condições mais humanas para que as sociedades caminha-
São pilares dessa sua investida, iniciada nos finais do século passado ram e tentavam caminhar.
e principio deste milénio, as novas tecnologias de comunicação que O neoliberalismo aqui na Europa parece não estar interessado numa
lhe permitem a expansão e a globalização e a possibilidade de aderir retoma.
à prática da corrente, anglo saxónica, do capitalismo neoliberal de Os objectivos perseguidos pelos governos europeus e organizações
M. Friedman. Via que contém em si todos os ingredientes para sufocar, envolvidas (BCE, Comissão Europeia, Banca e grandes empresas)
estrangular e aniquilar de vez o Estado Social. parecem não visar uma retoma rápida nem a redução das assimetrias
Com a globalização o capital torna-se movediço, sem pátria, fora- da zona Euro e da EU.
gido dos impostos e de qualquer outra obrigação contributiva. Não se Será que para eles o essencial é evitar um novo “crash” prova-
criaram ainda impostos ou contribuições supranacionais, apesar dos velmente superior ao de 2008? E para isso não hesitam em aumentar
14 BOLETIM DA ASSOCIAÇÃO DOS PUPILOS DO EXÉRCITO