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Evocações        PALAVRAS SOLTAS  -  I


                   o Boletim anterior con-    nalidades como um dos meus pro-      Gomes  (1860/1941),  personalida-
                   cluí  uma  sucessão  de    fessores  de  Matemática,  capitão   de  cujo  percurso  cívico  teve  di-
                   dez crónicas com a de-     Pimentel, de nome completo, Ar-      mensão nacional, pois além de es-
                   signação  genérica  de     tur Ferrão Pimentel da Costa. Era    critor fluente, foi diplomata e esta-
         N“No  Pilão.  Encontro               bom  professor,  afável  e  delicado   dista,  tendo  exercido  o  cargo  de
         com  o  passado”.  Cada  crónica     no  trato.  Exalava  sempre  o  odor   presidente da República de 1923 a
         contava numa linguagem simples       suave  de  um  perfume  discreto  e   1925. E porque me refiro a literatu-
         e compreensível, uma história au-    agradável  ao  olfacto.  Outro  pro-  ra, exprimo aqui o meu pesar por
         tónoma, tendo como centro a casa     fessor que marcou presença cons-
         que nos congregou como comuni-       tante em 3 dos 4 anos que passei
         dade e nos preparou para os desa-    no Pilão, foi o capitão Botelho de
         fios do futuro.                      Oliveira que ensinava Óptica e era
            Escrever esse torvelinho de re-   como que director do curso. Trata-
                           cordações,   foi   va-se de uma pessoa cordata e de
                           jornadear  pelos   fácil comunicabilidade. Outra per-
                           caminhos    dis-   sonalidade silenciada nas minhas
                           tantes da juven-   crónicas  anteriores  foi  o  capitão
                           tude,  vencendo    Alves Ribeiro, um dos três docen-
                           as  densas  bar-   tes de Português que tive no IPE.
                           reiras  do  tempo   Não  se  tratava  de  um  pedagogo
                           e da memória. E    exemplar  e  era  pessoa  um  tanto
                           foi  também  um    melancólica,  mas  dava-nos  a  ler
                           olhar  reverente   textos de Aquilino Ribeiro, exímio
         Licínio Granada                                                                      Aquilino Ribeiro
                (19490154)  para  um  certo   prosador  e  cultor  do  Português
                           passado  e  para   moderno, que me habituei a admi-
                           aqueles  que  co-  rar desde então.                     a pedagogia actual ter reduzido o
         migo  se  cruzaram  na  caminhada                                         estudo  da  nossa  literatura  e  dos
         ansiosa  da  vida,  senão  também                                         nossos escritores, o que desvalori-
         uma forma de me ver, a mim pró-       «porque me refiro a lite-           za e refreia a formação duma cons-
         prio, em tão distante espaço tem-                                         ciência  cultural  portuguesa.  É
         poral. Confesso que se tornou ne-      ratura, exprimo aqui o             uma realidade tanto mais lamen-
         cessário algum exercício mental e    meu pesar por a pedago-              tável  quanto  a  aprendizagem
         gosto pela narrativa para descre-                                         duma  língua  estrangeira  –  o  in-
         ver  cenários  e  personagens  cuja  gia actual ter reduzido o            glês, se tornou obrigatória a partir
         recordação  resistiu  obstinada-                                          dos primeiros anos do ensino bá-
         mente à usura do tempo, essa for-    estudo da nossa literatu-            sico. Retornando a Manuel Teixei-
         ça poderosa que no seu permanen-       ra e dos nossos escrito-           ra Gomes, devo sublinhar o facto
         te fluir goiva os homens e delapida                                       de este notável cidadão, na quali-
         a memória. Naqueles escritos evo-     res, o que desvaloriza e            dade  de  presidente  da  República
         quei os dois directores que tive no   refreia a formação duma             ter  visitado  o  nosso  Instituto  em
         Instituto  e  alguns  professores  de                                     1923  e  também  em  1925,  ano  em
         quem consegui recordar algo que,        consciência cultural               que renunciou à chefia do Estado,
         a meu ver, merece ser contado. Fo-                                        em 10 de Dezembro. A propósito,
         ram todos eles nomes ilustres que            portuguesa»                  lembro-me  bem  de  que  no  meu
         serviram o Pilão com dedicação e                                          tempo  de  aluno,  os  então  presi-
         empenho. Poderei ainda dizer que,                                         dentes Óscar Carmona e Craveiro
         de modo geral, conservo uma ima-        A lembrança de mestre Aquili-     Lopes,  também  terem  visitado  o
         gem mais grata dos oficiais docen-   no Ribeiro traz-me à memória dois    Pilão,  onde  foram  acolhidos  com
         tes do que dos não docentes. É na-   outros  escritores,  seus  émulos    apreço e respeito. Eram figuras do
         tural.  Os  professores  encontra-   que, tal como Aquilino, elevaram a   Estado  Novo  que  souberam  hon-
         vam-se em termos pessoais e afec-    expressão  escrita  a  um  nível  de   rar a memória da 1ª República, vi-
         tivos mais perto de nós, alunos, e   apurada beleza literária, pela ele-  sitando  o  nosso  Instituto.  Mas
         eram eles que, comprometidos na      gância  e  singularidade  do  estilo   como o tempo passa e a vida muda,
         causa do ensino, nos transmitiam     com que escreveram. Refiro-me a      termino este despretensioso texto
         o bem precioso do saber.             Manuel  Mendes  (1906/1969),  es-    questionando-me,  curioso:  E  na
            De  entre  os  professores  omiti-  critor e escultor, num acertado co-  actualidade,  que  altas  figuras  do
         dos  no  meu  persistente  escrevi-  núbio da literatura com a escultu-   Estado distinguem os Pupilos do
         nhar,  posso  também  citar  perso-  ra.  E  estoutro,  Manuel  Teixeira   Exército com a sua visita?



           12 | Associação dos Pupilos do Exército                                                                                                                                                              Associação dos Pupilos do Exército | 13
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